
Quando chegou à capital paulista, não havia mais ingresso para entrar no estádio e nem lugar na Fan Fest da Fifa no Vale do Anhangabaú.
Foi nessa situação que eu o interrompi para perguntar qual é o sentido da vida.
Fosse outro era bem capaz que o rapaz dissesse qualquer xingamento em espanhol e saísse às pressas em busca de um local com TV. Mas eis que Rafael responde:
“O bem é o sentido da vida, penso que seja isso. Para mim não tem outra coisa que não seja fazer o bem. Apesar de existir o mal, não há nada melhor do que fazer o bem”, sugeriu, pouco após dizer que “é difícil a pergunta, muito complicada. Mas a pessoa deve ter um propósito, aí a vida tem sentido. A vida não tem sentido para muita gente”, disse o simpático argentino, que trabalha na parte administrativa da casa do governo.
Ele deu a resposta sob pressão dos amigos, que o apressavam para terminar a conversa e ir logo achar um lugar para ver a partida. “Estamos aqui parados porque não há mais entrada para nada, nem no estádio, nem na Fan Fest. Estamos vendo onde vamos ver o jogo, talvez em um bar.”
Não foi só com Rafael que eu falei naquela tarde cinzenta de feriado em São Paulo. Eu estava de folga e ainda não tinha ido nenhuma vez às ruas na hora de jogo. Achei que seria uma ótima oportunidade para perguntar o sentido da vida aos estrangeiros que estão no país e, de “lambuja”, ter um argumento para bater um papo com eles.

Fui para o Vale do Anhangabaú porque sabia que teria um aglomerado de turistas perdidos sem conseguir entrar na “Fan Fest”. Não deu outra, encontrei uma bela representação do mundo por lá. Falei com noruegueses, holandeses, argentinos, taiwanesas, nigerianos, uma jornalista inglesa e até com um pastor de igreja evangélica que distribuía bolachas “Maria” com dizeres bíblicos aos estrangeiros.
“A gente vê que hoje em dia as pessoas têm muita fome de viver e buscam uma razão, um sentido, o que estou fazendo aqui nessa vida. Às vezes as pessoas buscam no trabalho, na comida, na bebida, no sexo. E de repente aparece o futebol e de repente o pessoal canalizou as emoções dele todinha para o futebol. E fica muito tênue, na superfície”, disse o pastor Daniel Checcio, de 49 anos, entre a entrega de uma bolachinha e outra.
“A gente acredita que a palavra de Deus nos ensina valores, solidariedade, amor, fraternidade, paz, isso tudo foi exemplificado na pessoa de Jesus, por isso somos evangélicos. E trazemos essa bolachinha com versículos da palavra porque Jesus disse, não só de pão vive o homem. (…) O sentido da vida é Jesus, a gente crê que o homem é corpo, alma e espírito. Há quem creia que é só corpo e eu respeito”, afirmou.

Falei também com dois amigos nigerianos, que vivem em São Paulo e observavam atenciosamente a “muvuca” de estrangeiros na frente do Teatro Municipal.
“O sentido da vida? Ah, não me pergunta que quando eu lembro desse assunto eu começo a chorar e então eu não penso nisso”, me disse Nureni Tijani, de 45 anos.
“Para mim é como um lírio: quando o sol está brilhando, a flor abre, quando o sol vai embora, ela fecha. Assim é a vida. quando você nasce, vive, e morre”, afirmou o outro nigeriano, Samuel Ehije, de 50 anos. “A vida é continuidade”, concluiu.
Mais a frente, a jornalista inglesa Samantha Pearson Passos, de 31 anos, filmava alguns brasileiros para enviar ao site do jornal “Financial Times”, onde trabalha. “Eu vivo em São Paulo, mas sou da Inglaterra e estou no Brasil há 4 anos”, disse. “Não paro muito para pensar sobre o sentido da vida, mas eu tento ser feliz a cada dia. Eu me casei com um brasileiro no ano passado e acho que realmente achei a felicidade, normalmente as pessoas trazem felicidade. Mudou minha vida depois de casar, realmente”, o sentido da vida é “estar com as pessoas certas”, concluiu.
Um grupo de moças taiwanesas passava apressado à frente, junto com dois tradutores brasileiros. “O sentido da vida é viajar ao redor do mundo. Gosto de conhecer pessoas diferentes, mas a segurança é importante também. Me sinto um pouco insegura aqui’, afirmou Eileen Chang, de 39 anos.
“Nunca parei para pensar nisso. Não sei como explicar”, afirmou a colega dela, Anne Home, de 40.

Encontrei também uns holandeses (que estavam certos que a Holanda ganharia o jogo):
“Ser feliz!”, respondeu Jeremy Kok, de 20 anos.
“Acreditar em Deus, orar. Eu não sou a melhor pessoa do mundo, mas eu estou tentando”, afirmou Johan Rang, de 23 anos.
Falei também com o argentino Cesar Herreira, de 39 anos, que havia viajado 36 horas de ônibus com seu filho Matias, de 9, na tentativa de ver a partida entre Argentina e Holanda.
“O sentido da vida é estar com a família. Minha esposa não pode vir mas eu trouxe ele. Não pudemos vir de avião, mas viemos de ônibus, não ficamos no melhor hotel, não conseguimos entrar no estádio, mas estamos aqui juntos. aproveitando como podemos”, declarou.